quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

do hebraico jehoiakim.

o meu avô tinha uma bicicleta. mais antiga do que esta da imagem. o meu avô não conduzia, mas pedalava. todos os dias, desde os meus dois anos, ia buscar-me a casa e levava-me com ele para o campo. não sei como faria nos dias de chuva. não me recordo. mas contam-me que nunca falhava. fui a primeira neta. continuo a ser a única. 

o meu avô trabalhava no campo de sol a sol. desde o raiar do dia até ao final da tarde. ia e vinha de bicicleta. nunca se esquecia da sua boina. contam-me que em tempos trabalhou em frança, mas eu já não sou dessa época.

[cresci no campo e no entanto sempre que me lembro da minha infância não consigo apontar um único dia de chuva. não porque não chovesse na altura. provavelmente associo esses belos dias à luminosidade do sol]


em pequena ia levar-lhe a merenda (aí por volta do meio da tarde). pão, chouriço caseiro, marmelada e, claro, os pauzinhos de chocolate que dividíamos por todos na sombra da figueira. já crescida, costumava sentar-me com ele no terraço em dias de sol. contava-me as histórias do antigamente. histórias da aldeia. de como era a vida quando não haviam estradas, mas caminhos. como viviam sem o automóvel, a televisão e tudo o mais. contava-me histórias do patrão - o senhor da grande quinta da aldeia para quem trabalhava.

o meu avô dizia que quando chegasse aos noventa anos de idade faria uma grande festa na qual toda a aldeia podia participar. o meu avô foi operado às cataratas e vivia há uma década com uma pilha no coração. não gostava de hospitais. (aspecto que lhe herdei). queria morrer em casa junto dos seus. não sabemos o que o que aconteceu primeiro: se a queda, se a paragem cardíaca, se ambas em simultâneo. morreu aos oitenta sete; já lá vai um ano.

continuo a sentir-lhe a falta. hei-de sempre sentir-lhe a falta. ficou o exemplo de uma vida honesta e de trabalho. ficou o sobrenome que uso com orgulho. e ficaram as memórias.

o meu avô chamava-se joaquim.
da bicicleta desconheço o paradeiro.

Sem comentários:

Enviar um comentário

digam de vossa justiça...